Imunoterapia no cancro: sem tratamento prévio com antibióticos

A disbiose intestinal, causada pela utilização prévia de antibióticos de largo espectro pode ter um impacto na eficácia da imunoterapia no cancro, levando a um decréscimo da probabilidade de sobrevivência do doente.

Publicado em 14 Julho 2020
Atualizado em 06 Outubro 2021
Actu PRO: Immunothérapie et cancer : pas d’antibiothérapie préalable

Sobre este artigo

Publicado em 14 Julho 2020
Atualizado em 06 Outubro 2021

A terapia imunológica com inibidores de checkpoint (TIIC) é uma forma de imunoterapia que constitui uma nova opção terapêutica contra alguns tipos de tumores, tais como o melanoma e o cancro do pulmão de não pequenas células (CPNPC). Apesar da sua eficácia, apenas um número restrito de doentes pode beneficiar dela. É por isso importante antecipar de forma mais eficaz a resposta ao tratamento e melhorar as guidelines de prescrições de rotina. Com essa finalidade, uma equipa de investigadores indagou se a duração da administração de antibióticos de largo espetro (ABL) maioritariamente usados para tratar infeções respiratórias - antes ou de forma concomitante com a TIIC – pode ter um impacto na eficácia do tratamento, devido à sua modulação da microbiota intestinal.

A sobrevivência dos doentes desceu dos 26 para os 2 meses

Este estudo de cohort prospetivo, conduzido em dois hospitais universitários, incluiu 196 doentes (137 homens e 59 mulheres, idade média: 68 anos) com cancro (119 com CPNPC, 38 com melanoma e 39 com outros tipos de cancro) que receberam TIIC durante mais de três anos. Os resultados indicam que a terapêutica com antibióticos administrada nos 30 dias antes da TIIC (pAB, isto é, antibióticos prévios) fez decrescer claramente a sobrevivência global dos doentes, independentemente do tipo de cancro (2 meses para doentes que receberam pABL vs. 26 meses para aqueles que não fizeram nenhum tratamento prévio com antibióticos). A percentagem de tumores refratários à terapêutica também foi consideravelmente mais alta em doentes que fizeram pABL (81% vs. 44%). Em conclusão, a altura da administração de antibióticos é crucial: embora não tenha um impacto negativo quando feita de forma concomitante com a TIIC, piora o prognóstico quando administrada previamente.

Compreender o papel da microbiota intestinal

Os autores sabem que os seus resultados são limitados pelo tamanho reduzido da cohort utilizada e pela falta da análise de correlação entre a terapêutica antibiótica e a composição da microbiota dos doentes. No entanto, estão alinhados com os resultados de estudos anteriores, que indicam que a disbiose intestinal está associada a uma fraca resposta à TIIC no cancro. Uma explicação possível é a de que a utilização de antibióticos pode levar a perturbações duradouras no ecossistema intestinal, o que pode prejudicar a eficácia das células T no combate ao cancro. No entanto, esta hipótese é pouco precisa e devem ser desenvolvidos estudos mecanicistas assim que possível para compreender como as alterações da microbiota intestinal induzidas pelo uso prévio de antibióticos impactam negativamente a eficácia da TIIC.