Estará o viroma e o micobioma envolvidos no cancro colorretal?

Estudos recentes exploraram pela primeira vez os componentes fúngicos e virais da disbiose intestinal em doentes com cancro colorretal. Poderão surgir novas vias de diagnóstico e terapêutica a partir dos resultados.

Publicado em 14 Julho 2020
Atualizado em 06 Outubro 2021
Actu PRO : Cancer colorectal : un rôle pour le virome et le mycobiome ?

Sobre este artigo

Publicado em 14 Julho 2020
Atualizado em 06 Outubro 2021

A investigação no cancro colorretal (CCR) foca-se principalmente em populações bacterianas, mas tem sido gradualmente ampliada de forma a incluir outros microrganismos (fungos e vírus). Um estudo realizado por uma equipa de Hong Kong focou-se nas especificidades do micobioma em doentes com cancro colorretal. A análise das fezes de 73 doentes e 92 voluntários saudáveis revelou uma assinatura fúngica em doentes com CCR: a proporção Basidiomycota: Ascomycota estava aumentada (os dois filos mais abundantes no micobioma humano), embora a abundância e a diversidade fúngicas se mantenham inalteradas.

Leveduras oportunistas e protetoras

Mais especificamente, 6 géneros de fungos foram mais abundantes nas fezes de doentes com CCR e, entre eles, alguns patógenos oportunistas como Acremonium (Ascomycota) e Rhodotorula (Basidiomycota). O mesmo foi observado para a levedura Malassezia (Basidiomycota), que geralmente é encontrada na pele e está envolvida na dermatite atópica, entre outras doenças. Poderia, portanto, ser capaz de colonizar os intestinos através de um mecanismo semelhante ao usado por Candida albicans (Ascomycota). Algumas espécies de Aspergillus foram também mais abundantes em doentes com CCR, em particular A. flavus, que produz aflatoxina e é potencialmente carcinogénica. Pelo contrário, os níveis da levedura Saccharomyces cerevisiae, conhecida por colonizar a microbiota intestinal e possuir outras propriedades anti-inflamatórias e reguladoras do sistema imunológico, eram reduzidos em doentes com CCR. Segundo os autores, isto poderia constituir uma potencial abordagem terapêutica. Estas disbioses fúngicas foram validadas pela mesma equipa em duas outras coortes e poderiam ser usadas como biomarcadores de diagnóstico.

Um papel indireto para os bacteriófagos?

Um outro estudo refere que investigadores norte-americanos analisaram as fezes de 30 doentes com carcinoma, 30 doentes com adenoma e 30 indivíduos saudáveis. Observaram que a diversidade e abundância viral não estavam alteradas em doentes com carcinoma/adenoma e esclareceram o papel de certos bacteriófagos (das famílias Siphoviridae e Myoviridae, entre outros) na carcinogénese colorretal. Segundo os cientistas, alguns bacteriófagos podem perturbar as populações bacterianas do cólon e estar associados à progressão do tumor. Ao promover a lise bacteriana, poderiam permitir que espécies oportunistas associadas ao epitélio produzissem um biofilme que favorecesse a entrada, no lúmen intestinal, de bactérias oncogénicas que desencadeassem a resposta imunitária inflamatória. A menos que sejam as bactérias a impactar o viroma, e não o contrário? Muitas hipóteses foram propostas e vários elementos ainda têm de ser esclarecidos de forma a aumentar o arsenal diagnóstico e terapêutico e combater o terceiro cancro mais diagnosticado no mundo em 2018.