Covid-19: envolvimento da microbiota intestinal?

A microbiota intestinal poderá estar implicada na gravidade da Covid-19, através da modulação das respostas imunitárias. Mesmo após a eliminação do vírus, a disbiose persiste nos pacientes infetados.

Publicado em 16 Março 2021
Atualizado em 30 Março 2022

Sobre este artigo

Publicado em 16 Março 2021
Atualizado em 30 Março 2022

Embora a Covid-19 seja principalmente uma afeção respiratória, surgiram recentemente trabalhos que apontam o dedo ao envolvimento da microbiota intestinal. Um novo estudo realizado no início de 2020 poderá confirmar esta hipótese. O referido estudo foi realizado junto de 100 pacientes com Covid-19 em 2 hospitais de Hong Kong (idade média: 36,4 anos; 47 casos ligeiros, 45 moderados, 5 graves e 3 críticos) e 78 controlos que foram recrutados antes da epidemia. Os objetivos eram encontrar uma ligação entre a microbiota intestinal e a gravidade dos casos, e avaliar a persistência de uma possível disbiose após a eliminação do vírus.

Disbiose intestinal nos pacientes Covid-19

A composição da microbiota intestinal de 87 pacientes, cujas fezes foram recolhidas durante a hospitalização, apresentava disbiose (mais espécies pertencentes ao filo Bacteroides e menos ao Actinobacteria) em comparação com os controlos e isto, de acordo com os autores, independentemente de um eventual tratamento antibiótico. Essa composição aparentou estar associada com a gravidade da doença, enquanto o tratamento por antibióticos, que abrangeu 34% dos pacientes, surgiu como o segundo fator explicativo dessa gravidade. Algumas bactérias imunorreguladoras (Faecalibacterium prausnitzii, Bifidobacterium bifidum) foram negativamente correlacionadas com a gravidade após a correção em função do uso de antibióticos e da idade. No entanto, a conceção do estudo (gestão clínica heterogénea, 31% dos pacientes com comorbilidades, etc.) não permite, neste estádio, confirmar os resultados obtidos.

Resposta imunitária associada

Paralelamente, a disbiose surgia correlacionada com concentrações mais elevadas de citoquinas inflamatórias e outros marcadores sanguíneos. Além disso, a composição da microbiota intestinal podia ser articulada com a dimensão da resposta imunitária à Covid-19 e com as lesões tecidulares associadas, podendo desempenhar um papel na regulação da gravidade da doença. No entanto, há uma outra possível explicação, de acordo com os autores: a disbiose observada poderá ser simplesmente uma reação ao estado de saúde e à situação imunitária dos pacientes, e não estar diretamente envolvida na gravidade da doença.

Disbiose persistente, mesmo após a eliminação do vírus

Por outro lado, a composição da microbiota intestinal de 27 pacientes analisados a até 30 dias após a eliminação do vírus mostrou diferenças em relação aos controlos: mais B. dentium e Lactobacillus ruminis e menos Eubacterium rectale, Ruminococcus bromii, F. prausnitzii e B. longum. E isso independentemente de terem recebido (14 pacientes) ou não (13) antibióticos, embora esse tratamento tendesse a acentuar a diferença. Segundo os autores, esta disbiose pode contribuir para a persistência dos sintomas. No entanto, seria necessária uma monitorização a longo prazo (3 meses a 1 ano após a eliminação do vírus) para se confirmar a ligação entre a disbiose e os sintomas persistentes.