E se a manipulação da microbiota puder melhorar a resposta à imunoterapia?

A microbiota intestinal pode modular as respostas à imunoterapia. Embora seja demasiado cedo para propor um cocktail de probióticos cientificamente validado, a utilização de antibióticos durante a terapia deverá ser melhor justificada.

Publicado em 09 Setembro 2020
Atualizado em 30 Março 2022
Photo : What if manipulating the microbiota could improve the response to immunotherapy?

Sobre este artigo

Publicado em 09 Setembro 2020
Atualizado em 30 Março 2022

 

Mais eficaz e menos tóxica que a quimioterapia, a imunoterapia com células CAR-T é o objeto de um número crescente de ensaios clínicos. Este tratamento modifica geneticamente as células T, dando-lhes um Recetor Antigénico Quimérico (CAR), que lhes permite reconhecer e matar, de forma específica, células tumorais. Apesar dos resultados impressionantes em alguns doentes, a resposta clínica às células CAR-T continua a ser altamente variável.

A hipótese dos autores

Nesta revisão, os autores sugerem que manipular a microbiota pode melhorar as respostas às células CAR-T, ainda que não haja atualmente resultados publicados que o confirmem. O único estudo disponível, um estudo monocêntrico observacional com 25 doentes a receber células CAR-T, mostra que os respondedores têm uma composição microbiana diferente dos não-respondedores, sugerindo uma possível ligação entre a microbiota intestinal e a resposta das células CAR-T. No entanto, os autores baseiam a sua hipótese em vários pontos: a crescente evidência clínica e não clínica, que coloca o foco nos mecanismos de escape dos não-respondedores às células CAR-T; evidência clínica de melhoria nas respostas à terapia com inibidores de checkpoint de imunidade (ICI*) através da manipulação da microbiota intestinal (diversidade e composição); e, finalmente, as características imunológicas comuns das células CAR-T e dos ICI.

Quais são as recomendações práticas?

Se a microbiota está envolvida nas respostas à terapia com células CAR-T, a utilização de antibióticos de largo espetro durante a imunoterapia poderá resultar em disbiose, numa resposta reduzida ao tratamento e numa taxa de sobrevivência também reduzida. No que diz respeito aos probióticos, embora alguns grupos bacterianos possam ter um efeito positivo nas respostas à imunoterapia, os resultados de estudos clínicos não são sempre suficientemente consistentes para separar claramente as taxa em categorias “favoráveis” e “não favoráveis”. Consequentemente, um “cocktail” de bactérias vivas preparado cientificamente continua fora do alcance. Por agora, a equipa recomenda que não se utilizem probióticos disponíveis comercialmente durante o tratamento oncológico, já que estes podem diluir a flora intestinal nativa e potencialmente torná-la menos diversificada. Semelhantemente, a equipa aconselha a não utilização imprudente de antibióticos de largo espetro durante a imunoterapia e a terapia com células CAR-T.

 

* checkpoints de imunidade são usados pelos tumores para se protegerem dos ataques do sistema imunitário e podem ser bloqueados por terapia ICI, de forma a recuperar a função do sistema imunitário.