Vaginose bacteriana - um desequilíbrio na microbiota vaginal
Patologia ginecológica que é a mais frequente nas mulheres em idade fértil, a vaginose bacteriana afeta entre 23% e 29% da população feminina mundial1 . Com esta patologia, é tudo ou nada: tanto pode passar completamente despercebida... como alterar significativamente a vida das mulheres. Embora a causa permaneça até hoje desconhecida, a pista do desequilíbrio da microbiota vaginal parece confirmar-se2 .
- 1Peebles K, Velloza J, Balkus JE, et al. High Global Burden and Costs of Bacterial Vaginosis: A Systematic Review and Meta-Analysis. Sex Transm Dis. 2019 May;46(5):304-311.
- 2Chen X, Lu Y, Chen T, et al. The Female Vaginal Microbiome in Health and Bacterial Vaginosis. Front Cell Infect Microbiol. 2021 Apr 7;11:631972.
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Sobre este artigo
O que é a vaginose bacteriana?
A vaginose bacteriana é uma doença perniciosa e difícil de detetar. Já sabia? 50% das mulheres são assintomáticas, outras sofrem de irritações locais ou de corrimento vaginal com odor fétido1 .
Na prática, os médicos usam a classificação de Amsel2 para diagnosticar a vaginose bacteriana. Este método baseia-se na presença de pelo menos três dos seguintes critérios:
- Corrimento vaginal fino e homogéneo
- pH vaginal superior a 4,5
- Odor de amina (que, de facto, corresponde ao cheiro a peixe) após análise específica realizada em esfregaço vaginal
- Corrimento vaginal identificado na sequência de exame microscópico: presença de células de tecido vaginal às quais aderem múltiplas bactérias
Há muitos fatores de risco associados a esta doença: a idade, o ciclo menstrual, a gravidez, o historial sexual, e também as irrigações vaginais e o tabagismo1 . A disbiose vaginal induzida por tratamentos com antibióticos pode também contribuir para o desenvolvimento posterior de vaginose bacteriana, no que constitui um verdadeiro círculo vicioso, uma vez que esses mesmos antibióticos podem ser utilizados para tratar infeção1 .
Por fim, as mulheres com vaginose bacteriana têm uma maior probabilidade de virem a contrair infeções sexualmente transmissíveis (ISTs): herpes, papilomas humanos (HPV) ou SIDA, e também infeções bacterianas3 4 .
- Coudray MS, Madhivanan P. Bacterial vaginosis-A brief synopsis of the literature. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2019 Dec 24;245:143-148
- 2Onderdonk AB, Delaney ML, Fichorova RN. The Human Microbiome during Bacterial Vaginosis. Clin Microbiol Rev. 2016 Apr;29(2):223-38.
- 3Lewis FM, Bernstein KT, Aral SO. Vaginal Microbiome and Its Relationship to Behavior, Sexual Health, and Sexually Transmitted Diseases. Obstet Gynecol. 2017;129(4):643-654.
- 4Torcia MG. Interplay among Vaginal Microbiome, Immune Response and Sexually Transmitted Viral Infections. Int J Mol Sci. 2019;20(2):266.
50% das mulheres são assintomáticas, outras sofrem de irritações locais ou de corrimento vaginal com odor fétido
Existe alguma relação com a microbiota vaginal?
A vaginose bacteriana é associada a um desequilíbrio da microbiota vaginal1
, que é o que designamos de
(sidenote:
Disbiose
A "disbiose" não é um fenómeno homogéneo – varia em função do estado de saúde de cada indivíduo. É geralmente definida como uma alteração da composição e do funcionamento da microbiota, causada por um conjunto de fatores ambientais e relacionados com o indivíduo que perturbam o ecossistema microbiano.
Levy M, Kolodziejczyk AA, Thaiss CA, et al. Dysbiosis and the immune system. Nat Rev Immunol. 2017;17(4):219-232.
)
. Mas regressemos ao básico: a microbiota vaginal é dominada por várias espécies de bactérias, os
(sidenote:
Lactobacilos
Bactérias em forma de bastonete cuja característica principal é a de produzirem ácido láctico. É por essa razão que se fala em “bactérias do ácido láctico”.
Estas bactérias estão presentes no ser humano ao nível das microbiotas oral, vaginal e intestinal, mas também nas plantas ou nos animais. Podem ser consumidas nos produtos fermentados: em produtos lácteos, como o iogurte e alguns queijos, e também em outros tipos de alimentos fermentados – picles, chucrute, etc..
Os lactobacilos são também consumidos em produtos que contêm probióticos, com algumas espécies a serem conhecidas pelas suas propriedades benéficas.
W. H. Holzapfel et B. J. Wood, The Genera of Lactic Acid Bacteria, 2, Springer-Verlag, 1st ed. 1995 (2012), 411 p. « The genus Lactobacillus par W. P. Hammes, R. F. Vogel
Tannock GW. A special fondness for lactobacilli. Appl Environ Microbiol. 2004 Jun;70(6):3189-94.
Smith TJ, Rigassio-Radler D, Denmark R, et al. Effect of Lactobacillus rhamnosus LGG® and Bifidobacterium animalis ssp. lactis BB-12® on health-related quality of life in college students affected by upper respiratory infections. Br J Nutr. 2013 Jun;109(11):1999-2007.
)
. Essas bactérias permitem que se mantenha um pH ácido no seio da microbiota vaginal, o que previne a proliferação de bactérias patogénicas2
. Estão também presentes leveduras (Candida albicans), porém em menor quantidade3
.
Quando há vaginose bacteriana, esta flora microbiana é substituída por uma flora polimicrobiana que integra múltiplas bactérias (Gardnerella, Atopobium, Prevotella, Mobiluncus, etc.)1 . Isto provoca o aumento do pH da microbiota vaginal (que normalmente é muito ácido), atribuído principalmente à diminuição da flora predominante de Lactobacillus4 . Mas isso não é assim tão simples! A mera presença de certas espécies dessa flora polimicrobiana não parece causar infeções, ou seja, uma mulher não vai necessariamente apresentar sintomas se tiver na vagina espécies como Atopobium, ou Prevotella... De facto, a espécie Gardnerella vaginalis está presente em 90% das pacientes sintomáticas e em 45% das mulheres saudáveis5 . Esta bactéria foi por muito tempo considerada como o principal agente patogénico da vaginose bacteriana, antes de novas linhas de investigação terem revelado que a vagina pode ser colonizada por ela sem que surja infeção6 . A investigação continua, no sentido de identificar mais precisamente as causas desta infeção, que continuam ainda por determinar7 .
- Chen X, Lu Y, Chen T, et al. The Female Vaginal Microbiome in Health and Bacterial Vaginosis. Front Cell Infect Microbiol. 2021 Apr 7;11:631972.
- 2Greenbaum S, Greenbaum G, Moran-Gilad J, et al. Ecological dynamics of the vaginal microbiome in relation to health and disease. Am J Obstet Gynecol. 2019 Apr;220(4):324-335.
- 3d'Enfert C, Kaune AK, Alaban LR, et al. The impact of the Fungus-Host-Microbiota interplay upon Candida albicans infections: current knowledge and new perspectives. FEMS Microbiol Rev. 2020 Nov 24:fuaa060.
- 4Aldunate M, Srbinovski D, Hearps AC, et al. Antimicrobial and immune modulatory effects of lactic acid and short chain fatty acids produced by vaginal microbiota associated with eubiosis and bacterial vaginosis. Front Physiol. 2015 Jun 2;6:164.
- 5Onderdonk AB, Delaney ML, Fichorova RN. The Human Microbiome during Bacterial Vaginosis. Clin Microbiol Rev. 2016 Apr;29(2):223-38.
- 6Muzny CA, Taylor CM, Swords WE, et al. An Updated Conceptual Model on the Pathogenesis of Bacterial Vaginosis. J Infect Dis. 2019 Sep 26;220(9):1399-1405.
- 7Coudray MS, Madhivanan P. Bacterial vaginosis-A brief synopsis of the literature. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2019 Dec 24;245:143-148
35% Apenas 1 em cada 3 mulheres sabe que a vaginose bacteriana está associada a um desequilíbrio da microbiota vaginal
Vaginose bacteriana: como evitá-la?
O tratamento é exclusivamente aconselhado às mulheres com sintomas. As mais recentes recomendações médicas estabelecem que sejam receitados antibióticos por via oral ou vaginal1 . No entanto, embora estes possam ajudar a aliviar os sintomas, é infelizmente muito vulgar as pacientes terem recaídas2 .
Contudo, existem várias formas de reduzir as suas hipóteses de sofrer de vaginose! Evite determinados fatores de risco, como as irrigações vaginais, o tabagismo3 , etc.. E, para restaurar o equilíbrio da microbiota vaginal, a administração de probióticos por via vaginal ou oral4 5 , pode ser recomendada para o tratamento ou a prevenção de recaídas da doença.
- 1Chen X, Lu Y, Chen T, et al. The Female Vaginal Microbiome in Health and Bacterial Vaginosis. Front Cell Infect Microbiol. 2021 Apr 7;11:631972.
- 2Bradshaw CS, Brotman RM. Making inroads into improving treatment of bacterial vaginosis - striving for long-term cure. BMC Infect Dis. 2015 Jul 29;15:292.
- 3Coudray MS, Madhivanan P. Bacterial vaginosis-A brief synopsis of the literature. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2019 Dec 24;245:143-148
- 4López-Moreno A, Aguilera M. Vaginal Probiotics for Reproductive Health and Related Dysbiosis: Systematic Review and Meta-Analysis. J Clin Med. 2021 Apr 2;10(7):1461.
- 5Koirala R, Gargari G, Arioli S, et al. Effect of oral consumption of capsules containing Lactobacillus paracasei LPC-S01 on the vaginal microbiota of healthy adult women: a randomized, placebo-controlled, double-blind crossover study. FEMS Microbiol Ecol. 2020 Jun 1;96(6):fiaa084.
Este artigo recorre a fontes científicas homologadas. Em caso de sintomas, não hesite em consultar o seu médico generalista ou o seu ginecologista.