Destaques da APDW 2021

Feedback de congressos
Pelo Pr. Fergus Shanahan
Departamento de Medicina, University College Cork, Universidade Nacional da Irlanda, Cork, Irlanda; APC Microbiome Ireland, University College Cork, Universidade Nacional da Irlanda, Cork, Irlanda

Congress review 14_APDW

Durante a Semana da Doença Ásia- Pacífico (Asian Pacific Disease Week - APDW), enquanto as restrições da Covid-19 limitavam o contacto humano em todo o planeta, um simpósio virtual especial por satélite abordou a natureza mutável da sociedade moderna sobre o microbioma, incluindo o impacto do distanciamento social e as consequências para a saúde e o risco de doenças.

O Prof. Fergus Shanahan (University College Cork, APC Microbiome Ireland) introduziu o conceito de «microbioma social» que inclui os fatores que promovem a transmissão e partilha de micróbios no seio das redes sociais humanas [1]. Ele salientou que as consequências das influências sociais no microbioma são provavelmente mais evidentes nas pessoas idosas. A solidão, a vida dentro de casa, os cuidados institucionais e a perda do contacto humano - todos estes fatores aumentaram durante a Covid-19 - estão entre os fatores que levam a uma deterioração da saúde do microbioma com a idade. Sublinhando a necessidade de mais pesquisa sobre o estilo de vida e influências ambientais no microbioma, observou que a maior parte da variação no microbioma humano continua por explicar.

O Prof. Martin Blaser (Rutgers University, NJ, EUA) delineou, então, as influências conhecidas na composição do microbioma humano, e ilustrou a sua investigação pioneira sobre os efeitos adversos dos antibióticos. A perda progressiva de micróbios ancestrais tem ocorrido desde a introdução dos antibióticos [2]. Isto tem sido associado ao aumento da frequência de doenças crónicas não transmissíveis, incluindo doenças imunitárias e metabólicas. Embora a natureza causal destas associações não esteja comprovada, o Prof. Blaser reviu o seu próprio trabalho experimental que fornece provas claras de efeitos adversos permanentes, a longo prazo e mesmo transgeracionais dos antibióticos no microbioma e na saúde do hospedeiro.

O Prof. Francisco Guarner (Instituto de Pesquisa Vall d’Hebron, Barcelona, Espanha) mostrou como os micróbios intestinais moldam as respostas imunitárias da mucosa e sistémicas e particularmente a forma como um microbioma intestinal saudável promove respostas tolerogénicas em vez de imunogénicas do hospedeiro. Ele frisou que o significado clínico disto é demonstrado pelo impacto da microbiota nas respostas à imunoterapia em pacientes com cancro e como os antibióticos podem alterar a imunidade às vacinas [3]. O Prof. Guarner também mostrou a influência de determinados probióticos nas respostas imunitárias do hospedeiro.

Em discussão, os oradores destacaram a importância clínica de reter a biodiversidade dentro do intestino. Para além de limitar o uso pouco judicioso dos antibióticos de largo espetro, foi realçado o papel da diversidade alimentar como simples medida pessoal para manter a diversidade microbiana intestinal. Houve um consenso de que a modulação terapêutica da microbiota é uma perspetiva realista. Embora as promessas da ciência microbiológica sejam extensas, persistem muitas lacunas no conhecimento [4]. Desconhecimentos como as consequências a longo prazo do distanciamento social representam oportunidades para explorar a importância do microbioma na saúde e na doença em todos os setores da sociedade.

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De volta ao congresso

As associações entre etnia e sensibilização alimentar são mediadas pelo desenvolvimento da microbiota intestinal no primeiro ano de vida

Artigo comentado - Rubrica Pediátrica

Pelo Pr. Emmanuel Mas
Gastroenterologia e Nutrição, Hospital Saint-Antoine, Paris, França

Microbiota 14_Mas

Comentário ao artigo de Tun HM et al. Gastroenterology 2021 [1]

O envolvimento da microbiota intestinal, no início da vida, no desenvolvimento das doenças atópicas é cada vez mais enfatizado, mas durante a primeira infância as alterações ecológicas da microbiota intestinal em relação à sensibilização alimentar continuam a ser pouco claras. Os autores procuraram caracterizar e associar estas alterações ao desenvolvimento da sensibilização alimentar nas crianças. Neste estudo observacional, utilizando a sequenciação do ARNr 16S, os autores caracterizaram a composição de 2 844 microbiotas fecais em 1 422 crianças canadianas nascidas de termo. A avaliação da sensibilização atópica foi medida através de testes cutâneos à idade de 1 e 3 anos. Foram identificadas quatro trajetórias do desenvolvimento da microbiota intestinal, possivelmente moldadas pelo tipo de parto e pela origem étnica. Este estudo permitiu estabelecer uma ligação entre a persistência de uma baixa abundância de Bacteroides no intestino ao longo da primeira infância e a sensibilização aos amendoins durante a infância. É o primeiro a mostrar um papel de mediação da microbiota intestinal do lactente no desenvolvimento da sensibilização alimentar associada à etnia.

O que é que já sabemos sobre isto?

O número de crianças com uma alergia alimentar está a aumentar muito, representando atualmente 28% das crianças americanas com idades entre 1 e 5 anos. O estabelecimento da microbiota intestinal (MI) nos primeiros meses de vida pode estar envolvido nesta sensibilização aos alergénios alimentares [2]. Muitos fatores influenciam o estabelecimento da MI, como o tipo de parto (cesariana vs. vaginal), o tipo de amamentação (aleitamento materno ou de fórmula) e a utilização de antibióticos [3, 4]. Um estudo recente mostrou que a estrutura da MI também variava significativamente entre diferentes grupos étnicos [5].

Além disso, a transferência de MI de crianças saudáveis para ratos protege-os da alergia às proteínas do leite de vaca. Uma MI fraca nos lactentes pequenos e um nível alto de Enterobacteriaceae/Bacteroidaceae (E/B) nos lactentes pequenos e mais velhos são fatores preditivos de sensibilização aos alergénios alimentares [6].

Quais são as principais conclusões deste estudo?

O estudo incluiu 1 422 crianças da coorte canadiana CHILD (Canadian Healthy Infant Longitudinal Development) e foram realizados testes de picada (pneumoalérgenos e alérgenos alimentares) à idade de 1 e 3 anos. Foram colhidas amostras de fezes precocemente (3,5 ± 0,9 meses) e tardiamente (12,2 ± 0,3 meses).

A prevalência de atopia foi de 12% ao 1 ano e 12,8% aos 3 anos, com 9,5 e 5,8% de sensibilização alimentar e 3,3 e 10,1% de sensibilização aos pneumoalérgenos ao 1 e aos 3 anos, respetivamente.

A MI tardia tinha uma diversidade beta e variabilidade intraindividual mais fracas do que a MI precoce (p < 0,001). A MI tardia era enriquecida em Bacteroides, Faecalibacterium, Lachnospira, Prevotella, Lachnospiraceae não classificados e Clostridiales não classificados, mas pobre em Clostridium, Veillonella, Bifidobacterium e Enterobacteriaceae não classificados. A análise dos componentes principais permitiu a identificação de 2 clusters (C1 e C2, Figura 1). O C1 era composto por 75,5% de amostras precoces e o C2 era composto por 63,7% de amostras tardias; as amostras precoces e tardias das crianças nascidas por via vaginal sem profilaxia antibiótica intraparto eram do tipo C2, dominadas pelo género Bacteroides (Figura 2).

Os autores determinaram 4 trajetórias de acordo com o tipo de cluster precoce e tardio: C1-C1, C1-C2, C2-C1 e C2-C2. A trajetória C1-C1 é mais frequente nos lactentes asiáticos do que caucasianos (p < 0,05), bem como nas crianças com risco atópico vs. a trajetória C2-C2 (OR 1,9; IC 95% 1,15-3,14) ou C1-C2 (OR 2,38; IC 95% 1,43-3,96). Os lactentes da trajetória C1-C1 tinham o dobro da probabilidade de desenvolver sensibilização alimentar aos 3 anos de idade do que os da trajetória C2-C2 (OR 2,34; IC 95% 1,20-4,56) e C1-C2 (OR 2,60; IC 95% 1,33-5,09), nomeadamente ao amendoim (vs. C2-C2 = OR 2,82 ; IC 95% 1,13-6,01 e vs. C1-C2 = OR 2,01 ; IC 95% 0,85- 4,78) (Figura 3). As crianças que não adquiriram sensibilização ao amendoim aos 3 anos de idade tinham níveis persistentemente mais altos de Bacteroides (p = 0,044), níveis mais baixos de Enterobacteriaceae não classificados (p = 0,001) e uma relação E/B mais baixa (p = 0,013) durante a infância.

A trajetória C1-C1 da MI desempenhou o papel de mediador do risco de sensibilização alimentar e ao amendoim nas crianças de origem asiática. A associação foi mesmo forte para o amendoim (OR 7,87; IC 95% 2,75-22,55). Os lactentes da trajetória C1-C1 foram mais frequentemente colonizados por C. difficile; estas mesmas crianças, com a dupla característica de C1-C1 e colonizadas por C. difficile, tinham um risco superior de sensibilização alimentar (OR 5,69; IC 95% 1,62-19,99) e ao amendoim (OR 5,89; IC 95% 1,16-29,87).

Por último, a microbiota da trajetória C1-C1 tinha um défice no metabolismo dos esfingolípidos e nas funções relacionadas com a biossíntese dos glicoesfingolípidos.

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Quais são as consequências práticas?

Este estudo permite considerar perspetivas terapêuticas dirigidas à MI na alergia alimentar dos lactentes, quer como medida preventiva ou terapêutica.

PONTOS CHAVE

  • Durante o estabelecimento da microbiota intestinal no primeiro ano de vida, a persistência de níveis baixos de Bacteroides aumenta o risco de sensibilização alimentar, especialmente ao amendoim.
  • Este risco aumenta nos recém-nascidos de mães asiáticas.

Conclusão

Este estudo mostrou diferentes trajetórias de desenvolvimento da MI durante o primeiro ano de vida. Confirma o impacto do tipo de parto na MI. A persistência de níveis baixos de Bacteroides esteve associada a um risco de sensibilização alimentar, particularmente nos recémnascidos de mães asiáticas ou nos colonizados por C.difficile.

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Artigo

As dietas dirigidas à microbiota intestinal modulam o estado imunitário nos seres humanos

Artigo comentado - Fase adulta

Pelo Pr. Harry Sokol
Gastroenterologia e Nutrição, Hospital Saint-Antoine, Paris, França

Microbiota 14_commented article

Comentário ao artigo de Wastyk et al. Cell 2021 [1]

A alimentação modula o microbioma intestinal, o que por sua vez pode ter impacto no sistema imunitário. Aqui, os autores determinaram como duas intervenções dietéticas dirigidas à microbiota, uma com enriquecimento de fibras de origem vegetal e outra com alimentos fermentados, influenciam o microbioma humano e o sistema imunitário em adultos saudáveis. Utilizando um estudo prospetivo aleatorizado de 17 semanas (n = 18 por braço) combinado com med ições do microbioma e do hospedeiro, incluindo um perfil imunitário extensivo, os autores identificaram efeitos específicos de cada dieta. A dieta rica em fibras induziu um aumento da abundância das enzimas de degradação de hidratos de carbono codificadas pelo microbioma (CAZymes), apesar de não ter qualquer efeito na diversidade da comunidade microbiana. Embora a pontuação da resposta às citocinas se tenha mantido inalterada, observou se uma resposta «imunológica» à dieta rica em fibras e dependente da microbiota basal. Em contraste, a dieta enriquecida com alimentos fermentados induziu um aumento constante da diversidade da microbiota e diminuiu os marcadores inflamatórios. Estes dados mostram como a associação de intervenções dietéticas com perfis aprofundados e longitudinais do sistema imunitário e do microbioma pode forn ecer informação individualizada e a nível da população. Os alimentos fermentados podem ser úteis para contrariar a diminuição da diversidade do microbioma e o aumento da inflamação omnipresentes na sociedade industrializada.

O que é que já sabemos sobre isto?

A ligação entre a alimentação e a microbiota nos seres humanos foi demonstrada de muitas maneiras, incluindo a correlação dos hábitos alimentares com a diversidade ou a composição da microbiota [2]. Por outro lado, as alterações a curto prazo na dieta alteram rapidamente a microbiota intestinal humana [3]. Uma vez que a microbiota desempenha um papel importante na biologia humana, a sua manipulação, particularmente através de intervenções nutricionais, poderia ser um poderoso meio de alterar vários aspetos da saúde. Uma questão chave é se podem ser feitas recomendações alimentares gerais (em vez de personalizadas) com base nas interações microbiota-hospedeiro existentes para melhorar a saúde das populações. Muitas doenças crónicas não transmissíveis, que estão a aumentar rapidamente com a industrialização, estão ligadas à inflamação crónica. Do mesmo modo, as alterações na microbiota intestinal associadas à industrialização estão também bem documentadas. Dada a influência da microbiota no estado inflamatório, é concebível que uma dieta a ela dirigida possa mitigar a inflamação sistémica. Uma grande quantidade de publicações apoia o papel das fibras na saúde, particularmente através da estimulação da diversidade da microbiota e do papel positivo dos ácidos gordos de cadeia curta que são um produto da sua fermentação pela microbiota. O enriquecimento da dieta com fibras tem um impacto na microbiota e melhora os marcadores de saúde [4]. Estes resultados e a ingestão insuficiente de fibras na dieta média ocidental sugerem que a ingestão de fibras pode ser uma forma de modular o sistema imunitário humano através da microbiota. Vários relatórios sugerem que os alimentos fermentados, como kombucha, iogurte e kimchi, podem ter benefícios para a saúde, nomeadamente na manutenção do peso e na redução dos riscos de diabetes, cancro e doenças cardiovasculares [5].

PONTOS CHAVE

  • O estudo por métodos multiómicos sobre os efeitos da intervenção nutricional revela as ligações entre alimentação, microbiota e imunidade
  • Uma dieta rica em fibras leva a alterações funcionais da microbiota e a uma resposta imunitária dependente da microbiota basal
  • Uma dieta rica em alimentos fermentados induz um aumento da diversidade da microbiota e diminui os marcadores inflamatórios sistémicos
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Quais são as principais conclusões deste estudo?

Para examinar o efeito da dieta no microbioma e no sistema imunitário, foram recrutados adultos saudáveis para participar numa intervenção dietética de 10 semanas (18 sujeitos por grupo). Os participantes receberam uma dieta rica em fibras (em média, um aumento de 21,5 ± 8,0 g por dia para 45,1 ± 10,7 g por dia) ou uma dieta rica em alimentos fermentados (em média, um aumento de 0,4 ± 0,6 para 6,3 ± 2,9 porções por dia). Surpreendentemente, a dieta rica em fibras não levou a um aumento da diversidade da microbiota (Figura 1A), possivelmente devido a uma capacidade insuficiente da microbiota dos participantes para degradar os hidratos de carbono. No entanto, houve um aumento da abundância das enzimas de degradação dos hidratos de carbono. Foi observada uma diminuição dos ácidos gordos de cadeia ramificada (ácido isobutírico, isovalérico e valérico), embora não tenha sido possível determinar se tal se deveu a uma alteração funcional da microbiota ou a uma diminuição do consumo de produtos lácteos e de carne de bovino, que contêm níveis elevados destas moléculas. Foi observado um efeito da dieta no perfil imunitário que dependia da microbiota basal dos participantes.

Ao contrário da dieta rica em fibras, a dieta rica em alimentos fermentados induziu um aumento da diversidade da microbiota (Figura 1B). Este aumento não esteve principalmente relacionado com a colonização das bactérias probióticas consumidas, mas sim com a aquisição de novas bactérias ou a expansão de determinadas bactérias endógenas. Por último, o consumo de alimentos fermentados levou a uma diminuição do nível inflamatório sistémico com a diminuição de várias citocinas, quimiocinas e outras proteínas séricas inflamatórias, incluindo a interleucina (IL)-6, IL-10 e IL-12b.

Quais são as consequências práticas?

Este estudo mostra que a alimentação tem efeitos profundos na microbiota intestinal e na fisiologia do hospedeiro, o que confirma o seu papel na saúde e o seu papel potencial na prevenção das doenças. Uma dieta rica em fibras e enriquecida com alimentos fermentados tem efeitos muito diferentes. A melhor definição dos efeitos da alimentação na microbiota e na fisiologia do hospedeiro permitirá implementar estratégias preventivas ou terapêuticas a nível populacional, mas também a nível individual.

Conclusão

Este estudo prospetivo aleatorizado que avalia o efeito de uma dieta enriquecida com fibras ou alimentos fermentados mostra efeitos específicos de cada tipo de dieta na microbiota e na imunidade do hospedeiro. Isto confirma o papel fundamental da alimentação na saúde, particularmente através dos seus efeitos na microbiota intestinal.

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Artigo

Pode o microbioma intestinal ser visado de forma a otimizar a eficácia vacinal contra o sars-cov-2?

Síntese

Pelo Dr. Genelle Healey
BC Children’s Hospital Research Institute University of British Columbia, Vancouver, Canadá

Microbiota 14_COVID

O principal objetivo de uma vacina bem-sucedida contra o SARS-CoV-2, que é a principal esperança no controlo da pandemia da Covid-19, é conferir imunidade robusta e duradoura ao maior número possível de pessoas às quais a vacina foi administrada. Apesar de várias vacinas estarem a ser utilizadas em todo o mundo para gerir a pandemia do SARS-CoV-2, os surtos de Covid-19 em curso demonstram que a pandemia está longe de ter terminado. O desenvolvimento de novas estratégias para ajudar a controlar a propagação do vírus e/ou aumentar a eficácia das vacinas contra o SARS-CoV-2 pode revelar-se útil na luta contra a Covid-19.

EFICÁCIA VACINAL CONTRA O SARS-COV-2

As vacinas são administradas para desafiar os sistemas imunitários tanto inato como adaptativo. Um biomarcador comum de imunidade duradoura e proteção contra o SARS-CoV-2 são respostas de anticorpos. Por razões ainda mal compreendidas, as respostas dos anticorpos à vacinação contra o SARS-CoV-2 são altamente variáveis entre diferentes pessoas [1]. Com base nos resultados dos ensaios clínicos, a eficácia vacinal contra o SARS-CoV-2 no caso das vacinas aprovadas varia de cerca de 60 a 92% contra as estirpes originais do SARS-CoV-2, mas a proteção induzida pela vacinação contra as variantes preocupantes do SARS-CoV-2 (ou seja, alfa, beta, delta e gama) parece ser inferior [2]. Heterogeneidade nas respostas vacinais entre pessoas, eficácia vacinal reduzida com variantes preocupantes e potencial diminuição da eficácia vacinal ao longo do tempo comprometem todos os esforços contínuos para controlar a propagação do SARS-CoV-2. Por conseguinte, é fundamental compreender melhor os fatores que determinam as variações da eficácia vacinal contra o SARS-CoV-2 a curto e longo prazo.

FACTORES QUE AFECTAM A IMUNOGENICIDADE DA VACINA

Dado que todos recebem a mesma dose de vacina padronizada, mas as respostas imunitárias variam muito, é altamente provável que outros fatores para além do tipo de vacina influenciam a eficácia vacinal. Um número crescente de provas sugere que fatores como idade, doença crónica, maus comportamentos de saúde, depressão e stress têm impacto na capacidade de resposta do sistema imunitário às vacinas (Figura 1) [3-5]. Estes achados foram demonstrados em vários tipos de vacinas, pelo que é provável que seja traduzível para as vacinas contra o SARSCoV- 2. Curiosamente, a maioria dos fatores acima delineados também demonstraram ter impacto na composição e capacidade funcional do microbioma intestinal. É, por conseguinte, plausível que a disbiose microbiana intestinal causada por fatores do hospedeiro possa estar envolvida nas diferentes respostas vacinais observadas.

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VISAR O MICROBIOMA INTESTINAL PARA MELHORAR A EFICÁCIA VACINAL?

A microbiota intestinal é uma coleção de bactérias, fungos, vírus e arqueias que residem no trato gastrointestinal e que co-evoluíram com o seu hospedeiro ao longo do tempo. Estes micróbios desempenham muitas funções importantes, uma das quais é regular as respostas imunitárias locais e sistémicas. Curiosamente, determinados perfis de microbiota intestinal (ou seja, maior abundância de Actinobactérias, Clostridium do cluster XI e Proteobactérias) têm sido associados a uma maior imunogenicidade vacinal contra infeções virais, como o HIV, influenza, e rotavírus [6-8]. Um estudo recente relatou que a perturbação específica do microbioma intestinal (ou seja, a disbiose) causada pelo antibiótico provocou uma neutralização de anticorpos induzida pela vacina pós-influenza, bem como concentrações mais baixas de respostas de anticorpos induzidas pela vacina [9]. Outro estudo utilizando tanto o tratamento antibiótico como ratinhos sem germes demonstrou que a deteção de um componente de motilidade bacteriana (flagelina) por um recetor encontrado nas células imunitárias (recetor toll-like 5 [TLR5]) foi necessária para promover uma resposta vacinal robusta [8]. Este e outros estudos semelhantes [10] fornecem provas do papel importante que a microbiota intestinal desempenha na eficácia vacinal (Figura 1). Contudo, até à data, nenhum estudo investigou o impacto que a microbiota intestinal tem na eficácia vacinal contra o SARSCoV- 2. Assim, a investigação futura que determina se as assinaturas específicas da microbiota intestinal têm impacto na eficácia vacinal contra o SARS CoV-2 é fundamental. Além disso, as terapias que visam o microbioma, ou seja, prebióticos e probióticos [11], poderiam ser utilizadas como adjuvantes da vacina (um agente utilizado para acelerar, melhorar e/ou prolongar as respostas imunitárias específicas dos anticorpos) para melhorar a imunogenicidade da vacina contra o SARS-CoV-2. Mais especificamente, a administração intranasal de bactérias láctico-ácidas (por exemplo, Bifidobacterium e Lactobacillus) demonstrou aumentar a resistência às infeções virais e melhorar a eficácia da vacina contra a gripe [12, 13]. Por conseguinte, a administração oral de bactérias vivas (probióticos) poderia aumentar as respostas imunitárias específicas da vacina se efetuada juntamente com as vacinas contra o SARS-CoV-2.

Conclusão

Independentemente da distribuição global das vacinas e das medidas de saúde pública direcionadas, a pandemia da COVID-19 continua a persistir. As vacinas são a principal esperança no controlo do SARS -CoV-2. Contudo, a heterogeneidade nas respostas vacinais compromete a luta contra a COVID-19. Vários fatores do microbioma intestinal têm sido envolvidos na alteração da imunogenicidade da vacina. Por conseguinte, a utilização do microbioma intestinal como adjuvante da vacina tem o potencial de melhorar a eficácia vacinal contra o SARS-CoV-2.

Fontes

Amodio E, Capra G, Casuccio A, et al. Antibodies responses to SARS-CoV-2 in a large cohort of vaccinated subjects and seropositive patients. Vaccines 2021; 9(7): 714.

Gupta RK. Will SARS-CoV-2 variants of concern affect the promise of vaccines? Nat Rev Immunol 2021; 21(6): 340-1.

Collier DA, Ferreira IATM, Kotagiri P, et al. Age-related immune response heterogeneity to SARS-CoV-2 vaccine BNT162b2. Nature 2021; 596(7872): 417-22.

Grupper A, Rabinowich L, Schwartz D, et al. Reduced humoral response to mRNA SARSCoV-2 BNT162b2 vaccine in kidney transplant recipients without prior exposure to the virus. Am J Transplant 2021; 21: 2719-26.

Madison AA, Shrout MR, Renna ME, et al. Psychological and behavioural predictors of vaccine efficacy: Considerations for Covid-19. Perspect Psychol Sci 2021; 16(2): 191-203.

Harris VC, Armah G, Fuentes S et al. Significant correlation between the infant gut microbiome and rotavirus vaccine response in rural Ghana. J Infect Dis 2017; 215(1): 34-41.

Cram JA, Fiore-Gartland AJ, Srinivasan S, et al. Human gut microbiota is associated with HIV-reactive immunoglobulin at baseline and following HIV vaccination. PLoS One 2019; 14(12): e0225622.

Oh JZ, Ravindran R, Chassaing B, et al. TLR5-mediated sensing of gut microbiota is necessary for antibody responses to seasonal influenza vaccination. Immunity 2014; 41(3): 478-92.

Hagan T, Cortese M, Rouphael N, et al. Antibiotics-driven gut microbiome perturbation alters immunity to vaccines in humans. Cell 2019; 178(6): 1313-28.e13.

10 Harris VC, Haak BW, Handley SA, et al. Effect of antibiotic-mediated microbiome modulation on rotavirus vaccine immunogenicity: A human, randomized-control proof-of-concept trial. Cell Host Microbe 2018; 24(2): 197-207.e4.

11 Lei WT, Shih PC, Liu SJ, et al. Effect of probiotics and prebiotics on immune response to influenza vaccination in adults: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. Nutrients 2017; 9(11): 1175.

12 Belkina TV, Averina OV, Savenkova EV, Danilenko VN. Human intestinal microbiome and the immune system: The role of probiotics in shaping an immune system unsusceptible to Covid-19 infection. Bio Bull Rev 2021, 11(4): 329-43.

13 Taghinezhad S, Mohseni AH, Bermúdez-Humarán LG, et al. Probiotic-based vaccines may provide effective protection against Covid-19 acute respiratory disease. Vaccine 2021; 9(5): 466.

14 Tregoning JS, Flight KE, Higham SL, et al. Progress of the Covid-19 vaccine effort: viruses, vaccines and variants versus efficacy, effectiveness and escape. Nat Rev Immunol 2021; 21(10): 626-36.

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Artigo

Plausibilidade de um papel fisiopatológico para a microbiota intestinal alt erada na doença inflamatória intestinal

Síntese

Pelo Pr. Jan Tack
TARGID, Universidade de Leuven Divisão de Gastroenterologia e Hepatologia, Hospitais Universitários de Leuven, Bélgica

SII
Microbiota 14_overview

52% Apenas 1 em cada 2 pessoas que sofreram de uma patologia digestiva envolvendo a microbiota, associa os dois

A doença inflamatória intestinal (DII) é um distúrbio intestinal funcional comum caracterizado por dor abdominal, que está associada a alterações na frequência e/ou consistência das fezes. Embora ainda não estabelecidos, a patogénese e uma multitude de mecanismos fisiopatológicos putativos foram propostos, incluindo: motilidade desordenada, hipersensibilidade visceral, inflamação de baixo grau, microbiota alterada, ativação imunitária, reações adversas a alimentos e disfunção do sistema nervoso central, etc. Em 2017, foram publicados 5 critérios putativos para mecanismos em distúrbios gastrointestinais funcionais em Gut. Aqui discutimos em que medida a microbiota intestinal alterada cumpre estes critérios de plausibilidade no contexto da DII e revemos a literatura disponível sobre o assunto.

Introdução

O distúrbio intestinal funcional mais comum, a doença inflamatória intestinal (DII), caracteriza- se por dor ou desconforto abdominal e está associado a alterações na frequência e/ou consistência das fezes, sem anomalias estruturais ou bioquímicas identificáveis que indiquem doença orgânica durante os exames complementares de diagnóstico de rotina [1, 2]. Para além da dor abdominal, os pacientes relatam também outros sintomas gastrointestinais como inchaço, distensão abdominal e flatulência. A DII pode ser dividida em diferentes subtipos, com base na consistência mais dominante das fezes: DII-C (obstipação predominante), DII-D (diarreia predominante), e DII-M (DII com hábitos intestinais mistos). Em termos de fisiopatologia, a DII é considerada um distúrbio heterogéneo e têm sido envolvidos diferentes mecanismos, incluindo dismotilidade gastrointestinal, hipersensibilidade visceral, disfunção do eixo cérebro-intestino e, mais recentemente, alterações na composição e manipulação do sal biliar, inflamação de baixo grau, ativação imunitária da mucosa e microbiota intestinal alterada [3].

A última década assistiu a um grande aumento do interesse pelo papel da microbiota intestinal na DII. A comunidade microbiana do intestino exerce uma série de funções, incluindo o metabolismo dos polissacáridos indigestíveis, a absorção de determinados nutrientes e iões, a absorção e deposição de lípidos alimentares, a regulação do metabolismo dos ácidos biliares e a produção de vitaminas como o folato, biotina e vitamina K [3, 4]. Ao competir com agentes patogénicos microbianos, reforça a proteção da barreira gastrointestinal. Ao interagir intensamente com a mucosa, a microbiota intestinal também afeta o sistema imunitário e a sinalização do intestino- cérebro do hospedeiro [5]. Estas diversas propriedades identificam a microbiota intestinal como um potencial contribuinte importante para a fisiopatologia e como um alvo apelativo para a terapia na DII.

De facto, múltiplos mecanismos associados ao ecossistema microbiano intestinal foram identificados em estudos fisiopatológicos da DII. Estes levaram a argumentos e observações variáveis para apoiar a relevância destes mecanismos candidatos individuais. Para avançar no terreno é necessário identificar o nível de relevância de tais putativos processos fisiopatológicos, uma vez que tal aumentaria o conhecimento e poderia dar prioridade ao alvo para a inovação ou otimização terapêutica. Há alguns anos, um grupo de peritos internacionais desenvolveu cinco critérios de plausibilidade para mecanismos em distúrbios gastrointestinais funcionais, tais como a DII [6]. Estes baseiam-se em aspetos tais como presença, associação temporal, correlação entre nível de deficiência e gravidade dos sintomas, indução em indivíduos saudáveis e resposta ao tratamento (ou história natural congruente se não for possível qualquer tratamento) (Figura 1). As secções seguintes avaliarão a hipótese putativa que envolve uma mudança na microbiota intestinal como mecanismo na geração e apresentação dos sintomas da DII (Caixa). O conhecimento atual sobre a microbiota intestinal na DII é resumido e são identificadas áreas para investigação adicional.

Figura 1
Critérios de plausibilidade dos mecanismos fisiopatológicos nos distúrbios da DII baseados numa publicação consensual [6], como pode ser aplicado para o papel dos mecanismos microbianos intestinais na patogénese dos sintomas da DII.

Plausibilidade de um papel fisiopatológico para a microbiota intestinal na DII

Presença de microbiota intestinal alterada na DII (A)

O primeiro critério de plausibilidade é que as alterações na microbiota intestinal são encontradas em pelo menos um subconjunto de pacientes com DII [6]. Vários estudos têm investigado a presença e o tipo de alterações da microbiota intestinal na DII em comparação com os controlos saudáveis. Pittayanon e colegas publicaram em 2019 uma revisão sistemática de 24 estudos de 22 publicações comparando a microbiota intestinal de pacientes com DII (principalmente adultos) com a microbiota de indivíduos saudáveis [7]. Concluíram que a família Enterobacteriaceae, a família Lactobacillaceae e o género Bacteroides aumentaram, ao passo que Clostridiales I, o género Faecalibacterium e o género Bifidobacterium diminuíram em pacientes com DII em comparação com os controlos [7]. Embora estas observações justifiquem a alteração da microbiota na DII, existe uma grande heterogeneidade nos resultados entre os diferentes estudos, o tamanho das amostras é geralmente pequeno e a maioria dos estudos ocorreu em cuidados especializados. Além disso, muitos estudos não corrigiram estatísticas para testes múltiplos e não consideraram fatores dietéticos e uso prévio pró- ou antibiótico. Além disso, não foram encontradas diferenças consistentes entre os subtipos de fezes da DII [7]. A proporção de pacientes com DII em que se pode identificar uma composição alterada de microbiota intestinal permanece pouco clara.

Associa ção temporal, de microbiota intestinal alterada com sintomas da DII (B)

A melhor prova para uma associação temporal entre alterações nos sintomas da microbiota intestinal e da DII pode ser derivada da entidade clínica de (PI-)DII pós-infeção [8]. Aproximadamente 10% dos pacientes com enterite infeciosa desenvolvem PI-DII com sexo feminino, idade mais jovem, sofrimento psicológico na altura da gastroenterite, e gravidade da infeção aguda como fatores de risco. O desenvolvimento de PI-DII está associado a alterações no microbioma intestinal, bem como a alterações da mucosa (inflamação de baixo grau, hiperplasia de células entero- endócrinas) [8]. Contudo, as alterações da microbiota na PI-DII parecem ser diferentes das descritas nos pacientes com DII em geral.

Correlação entre o nível de alteração da microbiota intestinal e a gravidade dos sintomas da DII (C)

Muito poucos estudos tentaram correlacionar a gravidade dos sintomas da DII com o grau de mudança na composição da microbiota intestinal, também referida como «disbiose». A maioria deles não conseguiu identificar correlações significativas entre as diferenças na abundância ou composição da microbiota fecal e a gravidade dos sintomas da DII [7, 9]. Num grande conjunto de dados de pacientes com DII, o grupo de Gothenburg utilizou a aprendizagem automática para identificar uma assinatura microbiana intestinal capaz de prever a gravidade dos sintomas da DII [9], sugerindo uma relação quantitativa entre as alterações da microbiota intestinal e a gravidade da DII. Contudo, é necessária a confirmação de outros estudos, e talvez estes devam incluir amostras de pacientes que não sejam de cuidados terciários, onde a variação da gravidade dos sintomas pode ser maior.

Indução de sintomas da DII em indivíduos saudáveis através de alterações na microbiota intestinal (D)

O quarto critério de plausibilidade, tal como descrito no manuscrito inicial [6], é um dos mais difíceis de cumprir. Existem muito poucos dados adequados para os diferentes mecanismos fisiopatológicos candidatos, e isto também se aplica às alterações da microbiota intestinal como mecanismo. A observação mais favorável deriva provavelmente do desenvolvimento da DII após o tratamento de uma infeção não gastrointestinal com antibióticos sistémicos [10]. A natureza da perturbação da microbiota intestinal após os antibióticos e o grau de semelhança com a microbiota intestinal na DII ainda são desconhecidos.

Resposta ao tratamento que visa a composição da microbiota intestinal (E)

Esta secção é a mais estudada quando se consideram critérios de plausibilidade para a composição alterada da microbiota intestinal como um mecanismo fisiopatológico na DII . Uma linha de prova é o efeito terapêutico benéfico dos antibióticos pouco absorvíveis, visando claramente a microbiota intestinal [11, 12]. Dois estudos com neomicina e cinco ensaios com rifaximina mostraram a eficácia destes de largo espectro pouco absorvíveis em pacientes com DII não-contaminados [11-14]. Além disso, um ensaio que avaliou a segurança e eficácia da repetição do tratamento com rifaximina confirmou também a viabilidade desta terapia na recidiva dos sintomas [15].

Os probióticos são definidos como preparações com microrganismos vivos que conferem um benefício para a saúde do hospedeiro quando administrados em quantidades adequadas. Várias meta-análises confirmaram a eficácia dos probióticos, como grupo, para melhorar os sintomas da DII [11, 16]. Contudo, a heterogeneidade dos desenhos e dos pontos finais dos estudos, e a relativa escassez de estudos com tipos probióticos específicos impedem que se chegue a uma conclusão forte ao nível das preparações individuais. Em contraste, os prebióticos, substratos que são seletivamente utilizados pelos microrganismos hospedeiros conferindo um benefício para a saúde do hospedeiro, não mostraram eficácia na melhoria dos sintomas da DII com base em meta-análises recentes [11, 17].

O transplante da microbiota fecal é provavelmente a forma mais direta de visar a microbiota intestinal para o controlo dos sintomas na DII [18]. Os estudos realizados até à data produziram resultados altamente variáveis, desde nenhum efeito até ao benefício sintomático, mas também agravamento dos sintomas, gerando conclusões contraditórias nas meta-análises [19, 20]. Contudo, estudos recentes mostraram alterações induzidas pelo FMT na composição da microbiota intestinal associadas ao benefício sintomático (transitório) e envolveram a seleção de dadores como uma questão crítica [21, 22].

TABELA 1
Caixa de destaque: Resumo do cumprimento dos critérios de plausibilidade para a microbiota intestinal alterada na DII.

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Questões não resolvidas e estudos futuros

No seu conjunto, as alterações na composição da microbiota intestinal parecem preencher os critérios de plausibilidade para a relevância fisiopatológica na doença inflamatória intestinal [6]. Os resultados estão resumidos na Figura 2. No entanto, há uma clara necessidade de conhecimento e investigação adicionais. São necessários mais estudos quantitativos e melhor controlados que caracterizem a microbiota intestinal na DII e controlos, e estes devem de preferência incluir grandes coortes de pacientes também dos cuidados primários. Isto permitirá uma melhor compreensão das mudanças na microbiota intestinal na DII a todos os níveis de cuidados, e tem o potencial de confirmar uma correlação entre a magnitude das mudanças na composição da microbiota intestinal e a gravidade dos sintomas da DII. Além disso, serão necessários estudos longitudinais na DII para estabelecer ainda mais a relação temporal entre as alterações da microbiota intestinal e o padrão e gravidade dos sintomas ao longo do tempo, dentro ou fora do quadro de um ensaio de tratamento.

Existe uma necessidade contínua de ensaios probióticos de maior qualidade na DII, utilizando durações de tratamento adequadas e parâmetros validados, semelhantes aos dos agentes farmacológicos. Por último, são esperados muitos novos dados sobre a utilização de FMT na DII, com potencial para clarificar as melhores modalidades e a eficácia desta opção de tratamento.

Figure 2
Relevância fisiopatológica das alterações na microbiota intestinal na doença inflamatória intestinal.

La composición normal de la microbiota intestinal refleja el estado de salud, sin síntomas de SII. Los acontecimientos agudos, como una gastroenteritis aguda o la ingesta de antibióticos sistémicos pueden alterar la composición de la microbiota intestinal, dando lugar a los síntomas del SII. síntomas del SII. Esto puede corregirse terapéuticamente mediante el uso de antibióticos no absorbibles, probióticos o transferencia de microbiota fecal. Traducción realizada con la versión gratuita del traductor www.DeepL.com/Translator.

Fontes

1 Lacy BE, Mearin F, Chang L, et al. Bowel disorders. Gastroenterology 2016; 150: 1393-407.e5.

2 Longstreth GF, Thompson WG, Chey WD, et al. Functional bowel disorders. Gastroenterology 2006; 130:1480-91.

3 Bonfrate L, Tack J, Grattagliano I, et al. Microbiota in health and irritable bowel syndrome: current knowledge, perspectives and therapeutic options. Scand J Gastroenterol 2013; 48: 995-1009.

4 Bajaj JS, Barbara G, DuPont HL, et al. New concepts on intestinal microbiota and the role of the non-absorbable antibiotics with special reference to rifaximin in digestive diseases. Dig Liver Dis 2018; 50: 741-9.

5 Margolis KG, Cryan JF, Mayer EA. The microbiota-gut-brain axis: from motility to mood. Gastroenterology 2021; 160: 1486-501.

6 Tack J, Corsetti M, Camilleri M, et al. Plausibility criteria for putative pathophysiological mechanisms in functional gastrointestinal disorders: a consensus of experts. Gut 2018; 67: 1425-33.

7 Pittayanon R, Lau JT, Yuan Y, et al. Microbiota in patients with irritable bowel syndrome-a systematic review. Gastroenterology 2019; 157: 97-108.

8 Barbara G, Grover M, Bercik P, et al. Rome Foundation Working Team Report on post-infection irritable bowel syndrome. Gastroenterology 2019; 156:46-58.e7.

9 Tap J, Derrien M, Törnblom H, et al. Identification of an intestinal microbiota signature associated with severity of irritable bowel syndrome. Gastroenterology 2017; 152: 111-123 e8.

10 Paula H, Grover M, Halder SL, et al. Non-enteric infections, antibiotic use, and risk of development of functional gastrointestinal disorders. Neurogastroenterol Motil 2015; 27: 1580-6.

11 Ford AC, Harris LA, Lacy BE, et al. Systematic review with meta-analysis: the efficacy of prebiotics, probiotics, synbiotics and antibiotics in irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther 2018; 48: 1044-60.

12 Fodor AA, Pimentel M, Chey WD, et al. Rifaximin is associated with modest, transient decreases in multiple taxa in the gut microbiota of patients with diarrhoea-predominant irritable bowel syndrome. Gut Microbes 2019;10: 22-33. 

13 Pimentel M, Chow EJ, Lin HC. Eradication of small intestinal bacterial overgrowth reduces symptoms of irritable bowel syndrome. Am J Gastroenterol 2000; 95: 3503-6.

14 Pimentel M, Chow EJ, Lin HC. Normalization of lactulose breath testing correlates with symptom improvement in irritable bowel syndrome. a double-blind, randomized, placebo-controlled study. Am J Gastroenterol 2003; 98, 412-9.

15 Lembo A, Pimentel M, Rao SS, et al. Repeat treatment with rifaximin is safe and effective in patients with diarrhea-predominant irritable bowel syndrome. Gastroenterology 2016; 151: 1113-21.

16 Li B, Liang L, Deng H, et al. Efficacy and safety of probiotics in irritable bowel syndrome: a systematic review and meta-analysis. Front Pharmacol 2020; 11: 332. 

17 Wilson B, Rossi M, Dimidi E, et al. Prebiotics in irritable bowel syndrome and other functional bowel disorders in adults: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. Am J Clin Nutr 2019; 109: 1098-111.

18 Goll R, Johnsen PH, Hjerde E, Diab J, Valle PC, Hilpusch F, Cavanagh JP. Effects of fecal microbiota transplantation in subjects with irritable bowel syndrome are mirrored by changes in gut microbiome. Gut Microbes 2020; 12: 1794263. 

19 Myneedu K, Deoker A, Schmulson MJ, Bashashati M. Fecal microbiota transplantation in irritable bowel syndrome: A systematic review and meta-analysis. United European Gastroenterol J 2019; 7: 1033-41.

20 Ianiro G, Eusebi LH, Black CJ, Gasbarrini A, Cammarota G, Ford AC. Systematic review with meta-analysis: efficacy of faecal microbiota transplantation for the treatment of irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther 2019; 50: 240-8.

21 El-Salhy M, Hatlebakk JG, Gilja OH, et al. Efficacy of faecal microbiota transplantation for patients with irritable bowel syndrome in a randomised, double-blind, placebo-controlled study. Gut 2020; 69: 859-67.

22 Holvoet T, Joossens M, Vázquez-Castellanos JF, et al. Fecal Microbiota transplantation reduces symptoms in some patients with irritable bowel syndrome with predominant abdominal bloating: short- and long-term results from a placebo-controlled randomized trial. Gastroenterology 2021; 160: 145-57.e8.

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O blue poop challenge um método fiável para avaliar o trânsito intestinal?

Pelo Pr. Gianluca Ianiro
Departamento de Gastroenterologia, Fondazione Policlinico Universitario Agostino Gemelli-IRCCS, Università Cattolica del Sacro Cuore, Roma, Itália.

Recentemente, surgiu um novo desafio viral nas redes sociais, incluindo Twitter e Instagram: o #BluePoopChallenge. Este desafio consiste em comer comida de cor azul (especificamente, dois queques feitos com corante alimentar azul real) e registar o tempo que demorou até ver fezes azuis na sua sanita.

Quanto a todos os exames impulsionados pelos doentes, recomendaria primeiro uma consulta com um profissional de saúde com experiência em doenças digestivas para evitar as abordagens DYI

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Recentemente, foi demonstrado que este método constitui uma forma simples e direta de medir o tempo de trânsito intestinal. Significa quanto tempo os alimentos demoram a passar pelo nosso trato gastrointestinal, desde a alimentação até à evacuação, e é normalmente avaliado para determinar a motilidade intestinal, que é um componente-chave da saúde intestinal. Num estudo recente [1] de Asnicar e colegas, publicado em Gut, os autores avaliaram o método do corante azul como marcador do tempo de trânsito intestinal, e a sua associação a marcadores de saúde específicos (incluindo consistência e frequência das fezes, composição e função do microbioma intestinal e saúde cardiometabólica) em 863 indivíduos saudáveis. 

Primeiro, descobriram que a consistência mais dura das fezes, medida com o British Stool Chart, está associada a um tempo de trânsito intestinal mais longo (>5 dias de mediana para o tipo 1), enquanto que a consistência mais suave corresponde a um tempo de trânsito intestinal mais curto (1 dia de mediana para o tipo 6).

Além disso, descobriram também que o tempo de trânsito intestinal está associado a várias características do microbioma intestinal. A diversidade alfa, que é um marcador de saúde microbiana, foi positivamente correlacionada com o tempo de trânsito intestinal. Um tempo de trânsito mais longo foi associado a taxas microbianas específicas, incluindo Akkermansia muciniphila (uma estirpe benéfica com propriedades metabólicas favoráveis), Bacteroides spp. e Alistipes spp. Geralmente, o tempo de trânsito intestinal foi associado a características do microbioma intestinal, mais do que a consistência ou frequência das fezes.

Por último, o tempo de trânsito mais longo foi associado à massa adiposa visceral e às respostas pós-prandial lipídica e glicose (ambos fatores de risco cardiovascular).

Em conclusão, o método do corante azul parece ser um marcador simples e barato do tempo de trânsito intestinal, que se verificou estar associado a marcadores da saúde humana, incluindo a diversidade e composição do microbioma intestinal, e a fatores específicos de risco cardiovascular. Poderá ser um método fiável para avaliar o tempo de trânsito intestinal quando necessário, ou seja, em doentes com obstipação).

A forma como este procedimento está a ser divulgado (expansão viral através das redes sociais) sugere que muitos doentes irão exigir este teste aos médicos. Quanto a todos os exames impulsionados pelos doentes, recomendaria primeiro uma consulta com um profissional de saúde com experiência em doenças digestivas para evitar as abordagens DYI. Depois, se os médicos confirmarem a necessidade de um teste de tempo de trânsito intestinal, então o método do corante azul será um método fiável e barato.

São necessárias avaliações futuras, incluindo comparações com outros métodos de avaliação do trânsito intestinal, para confirmar estes resultados e permitir um posicionamento em larga escala desta ferramenta no arsenal de diagnóstico de doenças gastrointestinais e nutricionais. 

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A Microbiota Vaginal #15

Pelo Pr. Markku Voutilainen
Faculdade de Medicina da Universidade de Turku, Gastroenterologia, Hospital Universitário de Turku, Finlândia

TRAÇAR O PERFIL DA MICROBIOTA VAGINAL PARA PREVENIR O PARTO PREMATURO

Pruski P, Correia GDS, Lewis HV, et al. Direct on-swab metabolic profiling of vaginal microbiome host interactions during pregnancy and preterm birth. Nat Commun. 2021 Oct;12(1):5967.

Prever o risco de nascimento prematuro utilizando um método simples, rápido e barato é um desafio para os obstetras, que ainda carecem de um método de previsão fiável para esta complicação clínica, a principal causa de morte em crianças com menos de cinco anos de idade. Os fatores de risco são bem conhecidos: disbiose vaginal associada a inflamação local. Uma equipa de investigadores teve a ideia de utilizar o seu método de análise DESI-MS (Desorption Electrospray Ionization Mass Spectrometry) recentemente descrito para identificar – em menos de 3 minutos e sem necessidade de preparação de amostras – os metabolitos presentes na mucosa cervicovaginal. As suas hipóteses? O metaboloma assim caracterizado pode tornar possível prever a composição da microbiota vaginal e as respostas imunitárias e inflamatórias locais, e monitorizar o seu desenvolvimento para estados associados ao risco de nascimento prematuro. O DESI-MS foi utilizado para analisar mais de 1.000 amostras cervicovaginais de 365 mulheres grávidas em duas coortes.

Entre os metabolitos detetados, 113 permitiram distinguir eficazmente dois tipos de microbiota: uma esgotada e a outra dominada por lactobacilos, um marcador de boa saúde vaginal. O perfil metabólico obtido utilizando o DESI- MS também previu os níveis de vários marcadores imunitários (IL-1β, IL-8, C3b/ iC3b, IgG3, IgG2, MBL – Manose-Binding Lectine) medidos num subgrupo de 391 mulheres. Alguns destes (C3b, IL-1β, IgG2, IgG3) foram encontradas a níveis elevados em microbiomas vaginais sem Lactobacillus, o que indica a ativação da resposta imunitária inata e adaptativa local. Numa série final de testes, o perfil metabólico vaginal obtido utilizando o DESI- MS não podia prever com fiabilidade o risco direto de nascimento prematuro. No entanto, os investigadores preveem potenciais aplicações clínicas. A monitorização dos metabolitos vaginais utilizando o DESI-MS poderia ajudar a detetar alterações na microbiota vaginal e nos marcadores imunitários locais associados ao parto prematuro.

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Gut Microbiota #15

Pelo Pr. Markku Voutilainen
Faculdade de Medicina da Universidade de Turku, Gastroenterologia, Hospital Universitário de Turku, Finlândia

A MICROBIOTA INTESTINAL MODULA A RESPOSTA AO TRATAMENTO DO CANCRO DA PRÓSTATA

Pernigoni N, Zagato E, Calcinotto A, et al. Commensal bacteria promote endocrine resistance in prostate cancer through androgen biosynthesis. Science 2021 Oct 8;374(6564):216-224.

O cancro da próstata (PC) é um dos cancros mais comuns nos homens. Como o crescimento e progressão dos tumores dependem dos níveis de androgénio, a terapia de privação de androgénio (ADT), a castração cirúrgica ou química é utilizada para tratar doentes com PC. No entanto, alguns deles desenvolvem um cancro da próstata resistente à castração (CRPC) que resulta na progressão do tumor e estão a ser investigadas novas estratégias de tratamento. Desde que estudos recentes destacaram o papel da microbiota tanto no desenvolvimento do cancro como no sucesso da terapia, os autores utilizaram modelos de ratinhos de PC e dados de doentes para examinar o papel da microbiota intestinal na carcinogénese de PC. O enriquecimento de Ruminococcus spp e Bacteroides acidifaciens foi detetado após o desenvolvimento de CRPC mas a ablação da microbiota intestinal abrandou o crescimento tumoral em ratinhos com CRPC. O transplante de microbiota fecal resistente à castração (FMT) de ratinhos resistentes à castração (CR) e a administração de R. gnavus levaram ao aumento dos níveis de androgénio circulante e ao aumento do crescimento de PC e do desenvolvimento de CRPC. O crescimento do PC foi controlado por FMT a partir de indivíduos com PC sensíveis às hormonas e à administração de Prevotella stercorea. Os doentes com CRPC tiveram enriquecimento dos géneros Ruminococcus e Bacteroides, associando se a resultados fracos, enquanto os doentes com PC sensíveis às hormonas tiveram uma maior abundância do género Prevotella associada a resultados mais favoráveis.

A microbiota intestinal comensal em doentes e ratinhos com privação de androgénios produz androgénios que, através da circulação sistémica, promovem o crescimento de PC e o desenvolvimento de CRPC. A modulação da microbiota intestinal poderia, teoricamente, ser utilizada como terapia adicional para o PC.

A ASSOCIAÇÃO ENTRE DISBIOSE INTESTINAL E DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÓNICA

Li N, Dai Z, Wang Z, et al. Gut microbiota dysbiosis contributes to the development of chronic obstructive pulmonary disease. Respir Res 2021 Oct 25;22(1):274.

Doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC) refere-se a doenças pulmonares (enfisema, bronquite e asma) caracterizadas por progressiva dificuldade respiratória. Estudos recentes revelaram que as mudanças na microbiota intestinal são semelhantes ao desenvolvimento da doença nos pulmões. Embora considerada principalmente uma doença respiratória, normalmente, a DPOC ocorre de forma concomitante com doenças crónicas do trato gastrointestinal. No presente estudo, os autores interessaram-se pelo eixo intestino-pulmão ligado à DPOC. As análises das fezes revelaram que os doentes com DPOC grave tinham uma menor abundância de Bacteroidetes, mas uma maior abundância de Firmicutes. Das famílias bacterianas, a abundância de Prevotellaceae foi maior na DPOC ligeira, enquanto que as abundâncias de Bacteroidaceae e Fusobacteriaceae foram menores na DPOC grave em comparação com os controlos saudáveis. Os níveis de ácido gordo de cadeia curta (SCFA) foram significativamente mais baixos na DPOC grave. A transferência de microbiota fecal (FMT) para ratinhos de doentes com DPOC causou uma redução significativa do peso e hipersecreção do muco das vias respiratórias em ratinhos. A aceleração do declínio da função pulmonar foi detetada em ratinhos FMT durante a exposição ao fumo de biomassa. Este estudo revelou que os doentes com DPOC têm disbiose da microbiota intestinal com níveis reduzidos de SCFA. Estas alterações estão possivelmente ligadas à inflamação das vias respiratórias e à progressão da DPOC.

O IMPACTO DA CO-MEDICAÇÃO NA EFICÁCIA DO TRATAMENTO DOS INIBIDORES DO PONTO DE CONTROLO IMUNITÁRIO

Kostine M, Mauric E, Tison A, et al. Baseline co-medications may alter the anti-tumoural effect of checkpoint inhibitors as well as the risk of immune-related adverse effects. Eur J Cancer 2021 Nov;157:474-484.

Os inibidores de pontos de controlo imunitários (ICI) melhoraram drasticamente o prognóstico de vários cancros avançados. As provas demonstraram que a microbiota intestinal pode modular a resposta ao tratamento para ICI, e pode também estar envolvida na patogénese de eventos adversos relacionados com a imunidade (IRAE). Embora se saiba que os antibióticos deterioram o prognóstico dos doentes com cancro tratados com ICI, pouco se sabe sobre o efeito na microbiota de várias co-medicações quando administradas no início de ICI. No presente estudo, os autores analisaram o efeito das co-medicações dadas 1 mês antes ou depois da administração da terapia ICI nos resultados do tratamento e a ocorrência de IRAE.

O uso de antibióticos, glicocorticoides (dose diária > 10 mg), inibidores da bomba de protões, fármacos psicotrópicos, morfina e insulina foi associado a uma sobrevida significativamente encurtada e a uma resposta tumoral reduzida. A terapia de combinação com estes medicamentos diminuiu a sobrevida mais do que a monoterapia. Estes medicamentos foram também associados a uma diminuição da incidência de IRAE. A co-administração de estatinas, inibidores de enzimas conversoras de angiotensina e/ou bloqueadores de recetores de angiotensina II, anti-inflamatórios não esteroides, aspirina e medicamentos antidiabéticos orais não teve impacto na sobrevida dos doentes. O presente estudo mostrou que a co-medicação influencia tanto a resposta como os IRAE do tratamento ICI. O impacto da co-medicação pode ser mediado através de microbiota ou outros mecanismos imunomoduladores. Na prática clínica, as co-medicações de base devem ser cuidadosamente avaliadas quando a terapia ICI é planeada. Os medicamentos com impacto negativo na terapia ICI devem ser evitados sempre que possível.

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Temas sobre o microbioma no GASTRO 2021

FEEDBACK DE CONGRESSOS

Pelo Pr. Eamonn M M Quigley
Lynda K and David M Underwood Center for Digestive Disorders, Division of Gastroenterology and Hepatology, Houston Methodist Hospital and Weill Cornell Medical College, Houston, Texas, USA

A WCOG 2020 estava programada para se realizar em Praga, a capital da República Checa, no final de 2020, mas foi adiada devido à pandemia da Covid e decorreu como uma reunião híbrida de 9 a 11 de dezembro de 2021. Graças à diligência e capacidade de organização de todos os envolvidos, foi desenvolvida uma excelente plataforma de reuniões virtuais que permitiu a transmissão de simpósios que abrangeram todo o espectro da especialidade, palestras especiais, comunicações livres originais e cartazes para o mundo inteiro. Nestas sessões, especialistas de todo o mundo juntaram- se aos professores da República Checa para abordar temas «quentes» e controversos. Aqui está um enfoque no microbioma intestinal.

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Em 2020, o tema do Dia Mundial da Saúde Digestiva, patrocinado pela WGO, foi «Questões Globais do Microbioma». Eamonn MM Quigley, em nome dos muitos colegas que contribuíram para este programa, apresentou os seus trabalhos que encapsularam uma visão geral do microbioma intestinal. Os fatores que influenciam o microbioma e moldam o seu desenvolvimento através desse período crítico e vulnerável desde o nascimento até à primeira infância foram delineados e o papel da dieta, ao longo da vida do indivíduo, sublinhado. Embora tenha sido proposto um papel para o microbioma em muitos estados patológicos, muitos estudos descrevem a associação, não a causa.

Uma doença em que um papel para o microbioma tem gerado muito entusiasmo é a síndrome do intestino irritável (SII). Mirjana Rajilic-Stojanovic explorou isto em pormenor e delineou os fatores que compõem a interpretação dos estudos microbiológicos na SII (por exemplo, pequeno tamanho da população estudada, heterogeneidade do fenótipo, conceção variável do estudo) que, sem dúvida, contribuem para a ausência de uma assinatura microbiana consistente na SII. Ela alertou-nos para dois organismos que podem ser de particular interesse: Methanobrevibacter smithii e Faecalibacterium prausnitzii; o primeiro através da sua produção de metano e o segundo através do seu papel na sinalização de células enterocromafínicas levando ao aumento da biossíntese da serotonina – um neurotransmissor fundamental do sistema nervoso entérico e alvo de muita farmacologia da SII.

TRANSPLANTE DE MICROBIOTA FECA

O microbioma oferece um enorme potencial terapêutico. Francisco Guarner atualizou a orientação probiótica da WGO e o fascinante tema do Transplante de Microbiota Fecal (FMT) foi abordado por Pavel Drastich. Ele contrastou a eficácia do FMT em doenças relacionadas com Clostridioides difficile com os dados muito mais mistos de outros estados patológicos. Entre estes últimos, a colite ulcerosa fornece os melhores dados (embora ainda classificados como de qualidade apenas moderada). Aqui, a interpretação dos resultados é obstaculizada pelos mesmos fatores que confundem tantos estudos de FMT: variabilidade na seleção da população, pontos finais de estudo e protocolo de estudo. Este último inclui variáveis tão incómodas como a utilização de fezes frescas vs. congeladas, via de administração (naso-jejunal, vs. enema, vs. colonoscopia vs. cápsula engolida), número de tratamentos (único vs. múltiplo) e fonte de material (único doador vs. material agrupado de múltiplos doadores). O mais fascinante foi o vislumbre que ele deu sobre o futuro do FMT, prevendo uma evolução do FMT tal como o conhecemos atualmente (isto é, amostras de fezes inteiras) através do desenvolvimento de combinações específicas ou consórcios de micróbios (uma área de atividade científica e comercial frenética) para a elaboração de compostos biológica e terapeuticamente ativos a partir de micróbios. Tanto a promessa como as limitações do FMT na SII foram desenvolvidas por Mirjana Rajilic-Stojanovic. Aqui os confundidores são vividamente expostos: um fenótipo altamente heterogéneo com uma gama variável e gravidade de sintomas que flutuam ao longo do tempo, uma compreensão incompleta do papel do microbioma e um conceito, na melhor das hipóteses, especulativo de como o FMT poderia funcionar. Não é de admirar que os resultados, até à data, sejam tão variáveis.

SITUAÇÃO ATUAL DA INVESTIGAÇÃO DA MICROBIOTA

Francisco Guarner liderou uma das sessões de abertura de todo o programa sobre um tema que retive até ao fim desta peça – a situação atual da investigação da microbiota. Esta foi uma palestra tipicamente atenciosa e perspicaz e muito oportuna, dado o impacto da epidemia da COVID-19 e da crise global de resistência aos antibióticos; será que precisamos de mais lembranças da importância dos micróbios que coabitam este planeta connosco? Voltou ao tema global ilustrando a primazia da dieta pobre na mortalidade global de risco, mas salientou habilmente que estas mesmas dietas empobrecem não só os humanos, mas também os seus micróbios e produtores de butirato em particular. Baixos níveis de diversidade microbiana intestinal foram ligados a vários estados patológicos, sendo um dos exemplos mais convincentes a asma infantil. Olhando para o futuro, salientou as inadequações de uma abordagem taxonómica ao estudo do microbioma em estados patológicos e ilustrou este ponto mostrando que em indivíduos normais a composição do microbioma intestinal é altamente dinâmica; até 90% das estirpes aparecem e desaparecem com o tempo! Assim, apelou a uma nova abordagem à definição de microbiomas normais vs. anormais (ou eubiose vs. disbiose, como alguns preferem) que enfatizava a competência funcional e a estabilidade ecológica (incorporando conceitos como a resistência à mudança estrutural da comunidade ao longo do tempo e a resiliência, a capacidade de regressar rapidamente à linha de base quando perturbada, como por exemplo por um antibiótico). Estes são conceitos-chave e refletem o atual afastamento da simples enumeração de números, espécies e estirpes microbianas para a descrição do potencial funcional utilizando a metagenómica e os ensaios de produtos metabólicos através da metabolómica e da metatranscriptómica.

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A alimentação com fórmulas no início da vida está associada a alterações da microbiota intestinal e a um aumento da resistência aos antibióticos em lactantes

ARTIGO COMENTADO - RUBRICA PEDIÁTRICA

Pelo Pr. Emmanuel Mas
Gastroenterologia e Nutrição, Hospital Saint-Antoine, Paris, França

Comentários sobre o artigo de Pärnänen KMM e al. Am J Clin Nutr 2021 [1]

Os lactantes correm um risco elevado de contrair infeções fatais cujo tratamento depende do funcionamento dos antibióticos. Os genes de resistência aos antibióticos (ARGs) estão presentes em grande número nos microbiomas intestinais dos lactantes nunca tratados com antibióticos, e a mortalidade infantil causada por infeções resistentes é elevada.

Neste artigo os autores pretendem determinar o impacto da exposição precoce à fórmula na carga de ARG em recém-nascidos e lactantes nascidos antes do termo ou de termo. Uma suposição foi que a dieta exerce uma pressão seletiva que influencia a comunidade microbiana no intestino dos lactantes e a exposição a fórmulas aumenta a abundância de ARG que transportam taxa.

O estudo mostrou que os lactantes alimentados com fórmulas tinham uma maior abundância relativa de agentes patogénicos oportunistas como Staphylococcus aureus, S. epidermidis, Klebsiella pneumoniae, K. oxytoca e Clostridioides difficile. Os lactantes alimentados com fórmulas também tinham significativamente menos bactérias infantis típicas, como as bifidobactérias, que têm potenciais benefícios para a saúde.

A nova conclusão de uma correlação entre a exposição a fórmulas e uma maior carga de ARG neonatal mostra que os clínicos devem considerar o modo de alimentação, além do uso de antibióticos nos primeiros meses de vida, para minimizar a proliferação de bactérias intestinais resistentes a antibióticos em lactantes.

O QUE É QUE JÁ SABEMOS SOBRE ISTO?

As bactérias resistentes aos antibióticos são a causa de muitas mortes neonatais. O aparecimento de bactérias resistentes é favorecido pelo uso de antibióticos, que está associado a um maior número de genes de resistência aos antibióticos (ARGs) transportados por estas estirpes bacterianas resistentes ou multirresistentes. Os elementos genéticos móveis (MGEs) transmitem os ARGs entre bactérias. Sabe-se também que o tipo de dieta modifica a microbiota intestinal, assim como a quantidade de ARGs. A magnitude do impacto da dieta infantil na resistência não tem sido adequadamente descrita na literatura.

QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS CONCLUSÕES DESTE ESTUDO?

Os autores incluíram 46 lactantes nascidos prematuros entre as 26 e as 37 semanas de gestação dos quais 21 foram alimentados com fórmula, 20 com leite materno fortificado e 5 com leite materno. Foram recolhidas fezes no prazo de 36 dias para analisar a composição da microbiota intestinal e a presença de ARGs. Trinta lactantes receberam um tratamento antibiótico: as fezes foram recolhidas cerca de duas semanas após o final do tratamento para limitar os efeitos de confusão.

Para comparar os resultados com os dados da literatura, foi analisada em paralelo uma meta-análise de cinco estudos, incluindo 696 recém-nascidos com dados semelhantes.

Os resultados mostraram que os lactantes alimentados com fórmula tinham quantidades significativamente mais elevadas de ARGs do que os lactantes alimentados com leite materno fortificado (x 3,6; 95% CI, 1,61-8,9) ou leite materno (x 4,3; 95% CI, 1,61-11,56) (p<0,01) (Figura 1).

A abundância de MGEs aumentou de forma semelhante (p<0,05). A abundância de Enterobacteriaceae, cujo genoma é conhecido por conter mais ARGs móveis, foi maior em lactantes alimentados com fórmulas (p<0,05) (Figura 2) e tendeu a estar inversamente correlacionada com a idade gestacional (p<0,1). Observou- se que quanto mais longa a gestação, menor a abundância destes ARGs (x 0,72; 95% CI, 0,57-0,89) (p<0,001). Vários ARGs eram significativamente mais abundantes em lactantes alimentados com fórmulas, incluindo genes que codificam a beta-lactamase de espectro alargado presente em Klebsiella (p<0,05).

Resultados semelhantes foram observados na meta-análise com um aumento relativo de 70% de ARGs em recém-nascidos alimentados com fórmulas (p=0,013). A carga mediana de ARG foi mais elevada nos lactantes alimentados com fórmulas em todas as coortes (Figura 3). Por último, uma análise da microbiota intestinal revelou que as bactérias pertencentes às famílias Bifidobacteriaceae, Veillonellaceae, Clostridiaceae, Lachnospiraceae e Porphyromonadaceae (incluindo as bactérias anaeróbias estritas) eram escassas em recém-nascidos alimentados com fórmula infantil; pelo contrário, as bactérias anaeróbias facultativas pertencentes às famílias Enterobacteriaceae, Staphyloccoccaceae e Enterococcaceae estavam aumentadas (p<0,05). Do mesmo modo, várias espécies potencialmente patogénicas incluindo espécies anaeróbias facultativas, como S. aureus, S. epidermidis, K. pneumoniae, K. oxytoca, e uma espécie anaeróbia rigorosa Clostridioides difficile, foram enriquecidas em recém-nascidos alimentados com fórmulas (p<0,001). Assim, a utilização de fórmulas infantis aumenta a proliferação de bactérias patogénicas com ARGs.

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QUAIS SÃO AS CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS?

Estes resultados apoiam o benefício do aleitamento materno. A alimentação de recém nascidos prematuros com leite materno está associada a um aumento de 70% dos ARGs em comparação com os alimentados exclusivamente com leite materno. O leite materno enriquecido resulta num menor aumento destes ARGs.

PONTOS CHAVE

  • A utilização de fórmulas infantis está associada ao aumento dos genes de resistência aos antibióticos (ARGs).
  • Esta resistência é transmitida entre bactérias por elementos genéticos móveis, com uma predominância de Enterobacteriaceae em lactentes alimentados com fórmulas.
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Conclusão

Além do uso adequado de antibióticos, é importante considerar o tipo de dieta para recém-nascidos prematuros, com preferência pelo leite materno para evitar a proliferação de bactérias resistentes.

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